Hoje, ao usar um aplicativo de transporte, o motorista comentou o preço dos chocolates com a proximidade da Páscoa. Complementou dizendo que não teve como esperar nas filas quilométricas na loja popular a que se dirigira na véspera. Imediatamente, me lembrei de uma época em que chocolate não era algo tão acessível, os preços eram muito altos e marcas internacionais tinham conhecimento de pequena parte da população. Lembrei que, às vésperas da Páscoa, meus avós e seus irmãos tingiam ovos de galinha com tecidos, enquanto os cozinhavam. Ao final, eram besuntados com óleo de soja e as cores brilhavam. Uma época em que presentear envolvia um aspecto lúdico, bem como, carinho, prazer em presentear, desejo de se fazer presente na vida do outro. A monetização das datas mágicas destroem-nas pouco a pouco. Presenteia-se com terceiras intenções; busca-se mostrar poder aquisitivo; disputa de prestígio pelo presente mais caro; demonstra-se sofisticação pelos embrulhos ou logos de lojas; … Mas esse preço, que substitui o valor das situações, traz consigo outros reflexos. Nada vale mais que muita coisa. Os dias atuais demonstram isso, quando duas vidas se vão em razão de dois pedaços de pizza. A vida chegou a valer um par de tênis, mas hoje é só um pedaço de pizza. Esse avanço do capitalismo selvagem, aguerrido com o uso das redes sociais, desumaniza o homem. E não me venham com a cantilena sobre ideologias. Esse capitalismo atinge direita e esquerda. Lembremos do relógio do socialista Macron e dos iphones dos camaradas comunistas do Brasil. Esse cenário nos coloca tão verdadeiramente próximos da Quaresma quanto dizer que há vida inteligente em Marte. A Quaresma deveria ser tempo de reflexão para um renascimento em novos comportamentos, mais empatia, mais justiça e caridade. Tudo esquecido, na pressa de pagar preços escorchantes por chocolates e enfrentar filas enormes.