Era para ser um Natal qualquer, mas nem de longe aquele seria. Imaginem, uma criança que todos os dias assiste incessantemente aos comerciais televisivos sobre uma tal “Caloi”. Pois bem, esta pequena criança, com seus 8 anos de idade, respira diariamente as propagandas natalinas. E sonha com o presente maravilhoso. Se imagina correndo, pedalando, desbravando as ruas do bairro, da cidade… Como é bom ser criança, ter a licença poética de se sonhar com o que se queira ser e fazer, sem se importar ou dar conta de que estes mesmos sonhos podem vir a ser pesadelos. As ruas já enfeitadas com luzes, a figura do Papai Noel era presente em vitrines e outdoors. E aquela criança fomentava alucinadamente aquele sonho. Os dias se passavam e, de repente, uma grande chance daquele sonho se realizar. A visita do dia era na casa do padrinho. Os olhos brilharam ao ouvir a mais linda frase: “- O que você quer ganhar de presente?????” Ganhou asas, flutuou entre os anjos que enfeitavam a linda e majestosa árvore, naquele canto literalmente iluminado de instante mágico. Os dias se passavam e, então, aquelas incessantes propagandas da bela “Caloi” já chegavam aos seus dias, não como sonhos, mas realidade próxima. Como toda criança, ela queria que o mundo todo soubesse da futura realização deste sonho. Mamãe – sentada em sua máquina de costura – pedalava sua “vigorelli”, cantarolando suas músicas. A criança chega perto e diz baixinho, mas com vontade de gritar alto: “- Padrinho vai me dar uma “Caloi”!!!” Meu Deus, naqueles olhos felicidade e preocupação ao mesmo tempo. Afinal o dinheiro era curto e havia outros irmãos. Naquele momento, com seus poucos 8 anos de idade, não havia muito o que entender. Mas para que entender? Faltava só um mês para que o Papai Noel, disfarçado de padrinho, pudesse realizar aquele sonho chamado “Caloi”. Os dias estavam agitados. Claro! Eram muitos os preparativos para a festa de Natal. Mas havia um murmúrio entre mamãe e a irmã mais velha. Esta irmã, à época, já tinha três filhos com idades próximas. Nas confabulações se juntaram outros dois irmãos. Imaginem vocês quantas crianças a sonhar com aquele Natal e, especialmente, naquele ano, estes sonhos eram uma unanimidade chamada “Caloi”. A criança curiosa que era ouvia os encontros da amada mãe e da irmã; por lógico, descobriu que a famosa “Caloi” seria o presente de todos os pequenos irmãos e sobrinhos. As discussões eram sobre as cores, pois o Papai Noel padrinho já havia antecipado que a da criança seria azul. Os dias passavam e a ansiedade era imensa. Cada vez que na TV, se ouvia “- Eu quero minha “Caloi”!”, a criança dizia: “- Ah, este Papai Noel que não chega nunca.” Enfim, o grande dia chegava com chuva, raios e trovões. E eu era aquela criança, aquele pequeno garotinho pensando “- Será que o Papai Noel tem guarda-chuvas?” A casa com seus sabores e aromas de uma linda ceia era somente festa. Os presentes chegavam um a um… e do meu Papai Noel disfarçado de padrinho nem sinal. Todos pedalando suas “Calois”… e as horas passando… “- Meu Papai Noel se atrasou?” Não! Ele se esqueceu. Aquela criança passou a vida esperando sua “Caloi”. Cinquenta e tantos anos se passaram. Foram tantos natais até aqui. Comprei e doei dezenas de bicicletas nunca ficando com uma para mim. Mas, depois destes tantos natais, uma lição foi aprendida: o meu sonho natalício pôde tornar realidade o sonho de muitos outros, e eu passei a vida toda podendo ser seus papais-noéis… Sim! Papai Noel existe, mesmo quando descoberto em uma promessa que não se cumpriu.