“Todos os homens desejam unicamente livrar-se da morte, não sabem livrar-se da vida” (Tao te Ching – Lao Tzi)
Numa mesma semana, receber dois telefonemas pressagiando a morte te balançam a vida! Um seguro de vida e uma morada feliz num cemitério vertical foram meus telefonemas da semana. O fato é que a morte não é assunto de sala de estar, gostoso de ser discutido, aceito ou vendido, a não ser pelas propagandas bem humoradas do Sinaf, onde alardeavam que seus clientes não voltavam para reclamar ou que, até mesmo com algodão no nariz, respiravam aliviados. Há quem repudie essa maneira jocosa de vender seus pacotes, mas o fato é que a morte é a certeza que nos assola, nosso ponto final. O que me faz lembrar o quanto os egípcios se preocupavam com essa passagem. O espírito do morto era conduzido à Osíris que, depois de todo um processo, por fim pesava o coração do morto, o qual deveria estar mais leve que uma pena. Será que conseguimos manter essa leveza pensando na finitude? Por certo, eu não! Fiquei matutando os telefonemas e pensando na frase de Schopenhauer: “O amor é a compensação da morte”. Espero, sinceramente, conhecer esse amor tão grandioso que compense o fim! O Ocidente espantou a morte de suas conversas e da normalidade, pois o que se vende é a ideia de uma jovialidade eterna, e, afinal, a morte não seria uma experiência humana aceitável. Penso no Dia de “los muertos” no México; a celebração de origem indígena, que há cerca de três mil anos permite que os falecidos visitem seus parentes no mundo dos vivos. Por isso os mexicanos enfeitam suas casas e preparam os alimentos preferidos por seus mortos. Hoje, o feriado mexicano foi “gourmetizado” e vendido pelos estúdios Disney, ficando restrito às pequenas cidades interioranas. No final das contas, eu não comprei o seguro nem meu sepulcro eterno! Me apeguei à frase de Confúcio, esperando que, fugindo da compra, a bendita se afastasse de mim: “Para que preocuparmos-nos com a morte? A vida tem tantos problemas.” A propósito, há uma história tibetana onde uma mãe que perde seu único filho, movida pela dor e com a criança em seus braços, pede a um monge uma fórmula para espantar essa dor. Ele orienta que ela vá, de casa em casa, e traga uma semente de mostarda daquelas que não foram, um dia, visitadas pela morte. A mulher anda, durante dias, mas sem conseguir encontrar uma casa de onde pudesse trazer tal semente; então, ela retorna ao monge ciente de que sua dor é compartilhada por todos. O seguro e a morada eterna podem ser evitados, mas é de bom augúrio encarar de frente essa verdade temendo menos a morte do que a vida insuficiente, como escreveu Bertolt Brecht.