“O estresse é um estado ignorante. Ele acredita que tudo é uma emergência.” (Natalie Goldberg)
Temos nos submetido a um modelo de vida onde a vida é o que menos importa. Afinal, viver envolve uma busca por bem-estar, harmonia e felicidade. O modelo atual, voltado principalmente para questões materiais e de imagem, nos geram um excessivo foco em sucesso, aceitação, acúmulo de bens, e atendimento aos padrões dominantes e ditados por uma ótica econômica e maligna. Com isso, o verdadeiro bem-estar e felicidade ficam distorcidos na sua essência, e, por consequência, a harmonia nunca está presente. “Sem bem-estar, a vida não é vida; é apenas um estado de lentidão e sofrimento.” (François Rabelais) Esse cenário explica o comportamento das pessoas que vivem exaustas, depressivas, esgotadas, estressadas, … Nunca se falou tanto em depressão, “burn-out”, esgotamento mental e síndromes comportamentais, que considero consequências desse comportamento desequilibrado na busca do inalcançável pela insatisfação constante. “Quando o bem-estar acaba e começa a aflição, começa a educação que a vida nos quer dar.” (Hermann Hesse) Essa insatisfação é crônica, pois sempre haverá algo a ser alcançado, como prova de atendimento aos ditames duvidosos, principalmente firmados pelas redes sociais – a nova ferramenta de marketing do capitalismo de exploração. Vencido um degrau, descobre-se que há outro e assim sucessiva e infinitamente. Não há fim, só insatisfação e ansiedade. As pessoas vão se esgotando, se exaurindo. Aliás, Cortella diz que “quando o modelo de vida leva a um esgotamento, é fundamental questionar se vale a pena continuar no mesmo caminho”. Mas o problema não é tão novo, lembrado que já na Bíblia, há uma preocupação com a questão (“Vinde a mim, todos vós que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei.” – Mateus 11:29). Imagine hoje com as demandas de comprovação de sucesso exigidas e ditadas pelo Instagram, Face Book, …? Esse modelo de exaustão permanente não gera somente as síndromes psíquicas e doenças físicas, que conhecemos e só crescem dia a dia. Trata-se de um modelo que, ao final, tem consequências outras. Lembro das palavras de Clarice Lispector no sentido de não saber se a motivação de seu desejo de descanso fosse pelo cansaço ou pelo desejo de desistir. Portanto, nessa dúvida motivacional, aquelas síndromes vão envolver desmotivação, sensação de impotência, inferioridade, derrota e incapacidade, ou mesmo de desmerecimento de viver. O suicídio pode ser uma consequência dessa exaustão. O suicida não faz uma escolha entre vida e morte, ele simplesmente quer dar uma solução a um problema, que, no seu caso, é estar fora da vida que lhe impõe a situação de sofrimento, ou seja, o sofrimento acabará independentemente do preço a ser pago. E Simone de Beauvoir já dizia que “a morte parece menos terrível quando se está cansado”. Se a vida não lhe atende, por que manter-se nela? Portanto, a exaustão exige aquilo que Cortella prega sobre refletir sobre a mudança de caminho, o que se confirma nas palavras do Dalai Lama sobre aqueles que estão passando por um grande sofrimento: “se você se sentir desmoralizado e exausto, é melhor, por causa de todos, retirar e restaurar a si mesmo. O ponto é ter uma perspectiva de longo prazo.”. Ambos estão corretos, pois a exaustão, e quem a conhece de perto sabe, é uma morte em vida, pelo sofrimento que ela traz e faz pesar sobre as vítimas. Há um vazio insuportável e cujo preenchimento parece impossível, por força da ansiedade em que se vive. Você já não tem mais essência ou justificativa. Sam Keen lembra que o “Burnout é a maneira da natureza de dizer a você que você passou pelos movimentos, que sua alma partiu; você é um zumbi, um membro da caminhada morta, um ”sleepwalker”. O designismo falso é como administrar estimulantes a um sistema nervoso exausto.”. Vê-se, indubitavelmente que há uma lógica nisso. Há que se ter muita coragem, força de vontade e, mais das vezes, ajuda profissional para reversão dos quadros de exaustão e esgotamento. A questão mais inglória está na dificuldade de reconhecimento do problema por quem o vive. Reconhecer significa, dentro do modelo, que você assume não ser suficiente para o que o momento lhe demanda. Mas isso é mentira, pois o problema não está na vítima, mas no modelo. Reconhecer a situação é sinal de força, amadurecimento e inteligência emocional, assim como também o é a busca pela cura.
Autoria: Fernando Sá
Autores citados: Natalie Goldberg, François Rabelais, Hermann Hesse, Mario Sergio Cortella, São Mateus, Clarice Lispector, Simone de Beauvoir, Dalai Lama, Sam Keen
Foto: David Melchor Diaz (Flickr)