CONDIÇÃO HUMANA = DIVERSIDADE CULTURAL
“A pluralidade humana, condição básica da ação e do discurso, tem o duplo aspecto da igualdade e diferença.” (Hannah Arendt)
Em um mundo aparentemente tão preocupado com diversidade – ainda que os comportamentos individuais demonstrem a busca de uma homogeneidade associativa, gerando verdadeiros guetos, a questão cultural prepondera desde sempre. Me lembro das diversidades culturais muito claras em países europeus de pequena extensão. Uma diversidade que não derivava só das imigrações e processos colonizatórios, mas também fruto de suas origens nacionais. Importante, então, antes de qualquer coisa, entender que cultura envolve, no sentido clássico, costumes e tradições de um povo os quais são transmitidos de geração em geração. Me atrevo a ver de forma mais moderna esse conceito de cultura na medida em que, hoje, falamos de costumes e tradições de grupos, o que é um espaço muito mais amplo do que “povo” no seu conceito político-sociológico. A diversidade cultural representa o conjunto das distintas culturas que existem no planeta. Assim, os elementos culturais seriam encontrados na língua, crenças, comportamentos, valores, costumes, religião, folclore, dança, culinária, arte, dentre outros. Portanto, o conceito de diversidade cultural é criado para compreender os processos de diferenciação entre as várias culturas que existem ao redor do mundo. Consequentemente, ao falarmos de diversidade cultural estamos nos reportando à identidade cultural de indivíduos ou de uma sociedade, ou ainda de um povo. Ou seja, há marcas que diferenciam pessoas e grupos, independentemente do lugar ou de uma população especificamente. Assim, aqui, os fundamentos pluralidade, variedade e diferenciação, em oposição à chamada homogeneidade. Vejo aqui dois problemas grandes a serem enfrentados, pois as acepções e presunções entre os diversos grupos geram, em regra, a dificuldade do convívio com a diversidade. E, muitas vezes, elas se originam de aspectos culturais do próprio grupo, como no caso de crenças, valores e costumes. Por isso, cada dia mais, acredito que a questão envolve mais obrigação do que gosto. Não se pode obrigar alguém a gostar das tradições e costumes de outro grupo, mas o respeito por eles deve ser obrigatório. “Posso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o direito de você dizê-las.” (Evelyn Beatrice Hall) Além disso, há que se ter um espelho que gere respeito-reflexo. Por vezes, creio que um ativismo radical – que busca o gostar, mais do que o respeitar, dificulta sobremaneira o convívio dentro da diversidade cultural. E quantas vezes esse radicalismo não acaba negando a diversidade ao querer uma homogeneidade, onde não existiria pluralidade, variedade e diferenciação? Reflito sobre isso, quando vejo um indivíduo alegar que determinado programa televisivo só deveria ter participantes de sua raça ou quando, em um casamento homoafetivo, o discurso envolve o “fim” dos heterossexuais. Onde o respeito à minha diversidade garante o desrespeito à diversidade do outro? “O mundo é um espelho, pois se sorrires para ele, ele sorrirá para ti.” (Gustave Le Bon) Talvez o grande problema seja anterior. Os seres humanos devem ser respeitados simplesmente por serem seres humanos com todas as suas características dentro de um conceito fraterno. Se você respeitar o próximo por reconhecê-lo como igual, você não se preocupará com a sua crença, etnia, idioma, gênero, sexualidade, posição econômica, … Obviamente que esse senso de liberdade nos caminhos das pessoas exige, como reconheceram os franceses, fraternidade, pois a liberdade costuma ser um caminho para o desrespeito à igualdade. “A liberdade e a fraternidade são palavras, enquanto a igualdade é uma coisa.” (Henri Barbusse) Como, em determinadas situações não concordar com Hobbes, de que “o homem é lobo do homem”? Lembremos do aterrador livro de Saramago (Ensaio sobre a cegueira). Mas como atuar individualmente, em um processo isolado e mais ideológico de empatia pelo outro, independente das nossas diferenças, para construção de um mundo melhor? O mundo é melhor com diversidade, pois a diversidade permite reflexão, ponderação, comparação cognitiva, …, ou seja, ela faz pensar. A homogeneidade pregada à direita e à esquerda, ideologicamente, ferem de morte o senso crítico, que é fator propulsor da evolução da sociedade, da humanidade. A solução está muito mais no olhar, no sentir, na empatia e na humanidade que nos discursos, gritos e slogans. Precisamos voltar a ensinar nossas crianças, e aprender com elas, a olhar e sentir, sem preconceitos, arrogância, presunção e totalitarismo sob qualquer suposta ideologia política. “Sem a cultura, e a liberdade relativa que ela pressupõe, a sociedade, por mais perfeita que seja, não passa de uma selva. É por isso que toda a criação autêntica é um dom para o futuro.” (Albert Camus)
Autoria: Fernando Sá
Autores citados: Hannah Arendt, Evelyn Beatrice Hal, José Saramago, Thomas Hobbes, Gustave Le Bon, Henri Barbusse, Albert Camus