“A lei de ouro do comportamento é a tolerância mútua, …” (Mahatma Gandhi)
No Brasil, vale a regra de que tudo pode sempre piorar. Meu avô sempre reclamava dos estádios de futebol, que deixaram de ser locais de espetáculos esportivos para se tornarem arenas romanas, onde se destila ódio e se louva o preconceito, a falta de educação, a violência vã, a falta de humanidade, … “A crueldade é um dos prazeres mais antigos da humanidade.” (Friedrich Nietzsche) Pois é, agora, as escolas viraram arenas, também. Platão dizia que “de todos os animais selvagens, o homem jovem é o mais difícil de domar”. As crianças precisam ter limites que os adequem a princípios morais e éticos que permitam a convivência social dentro de limites de urbanidade e civilidade. As crianças, criadas na falta de limites ou em ambientes familiares de autoritarismo violento, sempre representaram os principais protagonistas do bullying escolar no passado. Neste processo, elas discriminavam todos aqueles que não estivessem dentro de padrões de modelo estético e perfeição física. Convivíamos com o bullying contra gordos, usuários de óculos, deficiente físicos, afeminados, … Mas também agrediam aqueles que deles se afastavam ainda que de forma intelectual, como os chamados “CDFs” ou, mais modernamente “nerds”. Se justificava a tolerância a tais comportamentos sob a alegação de que as vítimas se tornariam mais fortes ou mais preparadas para a vida. Ressalte-se que Sêneca já entendia que a em regra a fraqueza estava nos cruéis (“Toda crueldade resulta de fraqueza.”), mas tal violência gerava e gerou graves reflexos às vítimas. Todavia, havia um certo grau de contestação a esses comportamentos pela ação dos professores. Os professores inibiam ou coibiam tais condutas preconceituosas e violentas. Entende-se, desde já, a importância da educação familiar complementada pela escola como local de educação informativa. Quando os pais terceirizaram seus papeis de educadores, eles iniciaram um processo de fortalecimento do bullying, pois não havia mais limites e conceitos morais e éticos; esses ensinamentos familiares não mais permeavam as crianças a partir de seus lares. Como tudo pode sempre piorar, os pais passaram a superproteger seus filhos, talvez por culpas (distanciamento, falta de paciência, …), e não mais aceitaram a imposição dos limites ainda que pelos professores. Em nome de adotar uma educação moderna e evitar traumas, os filhos passaram a poder tudo de forma egoísta e sem visão do grupo social. “Somos seres cada vez mais ilhados e com carência, não só de vínculos, mas de desejo de vínculos, o que é muito pior.” (Luiz Felipe Pondé) Conheço dezenas de casos de pais solicitando a demissão pela escola de professores que legitimamente impuseram limites a seus filhos, principalmente em colégios particulares. Vale a regra: “se pago a mensalidade, meu filho pode fazer o que quer na escola”. Dessa forma, ao bullying normalizado se somou a falta de autoridade dos professores, que não mais eram respeitados pelos alunos ou seus pais. Mas há também um certo descaso, hoje, pelos professores, que são diariamente desestimulados nas suas carreiras – Luiz Felipe Pondé navega também sobre esse ponto com maestria. Da escola particular à escola pública foi um passo. Esse caldeirão só poderia gerar o que presenciamos hoje, nos ataques a professores e bullying generalizado. Obviamente que outros elementos exógenos também se fazem presentes à situação, como o armamentismo, a cópia comportamental de exemplos ruins divulgados amplamente e sem controle nas redes sociais, o desrespeito e falta de empatia demonstrados publicamente por autoridades, … Não basta lei, para resolver isso, pois leis já existem; faltam, na verdade, estruturas familiares de educação e formação das crianças. Há a necessidade de repressão ao bullying e a violência escolar, mas existe, acima de tudo, a prioridade de rever o conceito de criar filhos dentro da sociedade. A escolha pela paternidade/maternidade deve se dar sobretudo pela assunção de responsabilidade na criação e educação dos filhos como elemento não delegável a terceiros. Sem paternidade/maternidade responsáveis, o bullying e a violência escolar dificilmente será sanada, principalmente agora que, pelo volume, parecer ser visto com certa “normalidade”; mais um caso de “normose” com o qual nos deparamos. “Age sempre de tal modo que o teu comportamento possa vir a ser princípio de uma lei universal.” (Immanuel Kant). A lei está ai, e a preventiva atitude dos pais e família como educadores originários? O cenário futuro se apresenta bem cinzento.
Autoria: Fernando Sá
Autores citados: Gandhi, Nietzsche, Platão, Sêneca, Luiz Felipe Pondé, Immanuel Kant