Em recente domingo – como se dá com alguma frequência, os amigos se reuniram para almoçar aqui em casa. É um tempo feliz, que passa extremamente rápido em função dos risos, comentários, drinks e pratos. São momentos para contar histórias, trocar experiências, dividir dúvidas e fazer piadas uns com os outros. Os assuntos vão dos mais frugais aos mais filosofais, mas sempre com boas pitadas de humor. Sorvidas algumas taças de Spritz Siciliano, um amigo, que os preparara com especial primor, inicia a história do último feito de seu sobrinho e as consequências do fato. Afinal, uma das funções da família é ser um constrangimento hilário. O jovem patrocinou com amigos uma festa, que, nos velhos tempos, poderia ser chamada de “festa de arromba”. E bombou e arrombou mesmo. Mas essas festas da juventude atual estão bem longe dos nossos “hi-fis” de ontem ou anteontem. Se espelham nas “farofas” de uma maluca da rede social, cujo nome nunca gravo. Rimos muito com a história, fizemos piada e, inclusive, nos propusemos a participar na próxima festa patrocinada pelo garoto. Obviamente, nos próximos seis meses não há possibilidade, pois o uso do salão de festa acabou vetado à família do “patroneur” pelo condomínio. De forma séria, nos propusemos até a pagar ingresso, como o fizeram alguns convivas da festa em questão. Por óbvio, talvez devido a idade ou a um pudor excessivo, não adotaremos o conceito de banheiro unissex. Provavelmente, também não pegaremos ou nos deixaremos pegar por todo mundo, compreendidos aqui todos os gêneros. Será? Insinuações a parte, findou o domingo; noite posta, todos partiram. Por alguma razão comecei a refletir sobre a tal festa. Rimos muito, é verdade. Mas, após refletir, me deparei com uma situação que deve ter sido muito tensa e muito constrangedora aos pais do garoto. Foi quando iniciei uma avaliação comparativa do que eram nossas traquinagens de juventude com as da galera de hoje. E, aí, não me limitei à festa em questão, mas rememorei outras histórias frequentemente abordadas pelos amigos sobre filhos, filhos de conhecidos, sobrinhos, …, e mais algumas de que tomo conhecimento por ocorrerem no condomínio onde moro. Nossas traquinagens tinham alguns limites muito claros como segurança, saúde, incolumidade, exposição da família e suas consequências (inclusive umas pancadas no lombo), … Pois é… Mudou. A galera pirou, os limites se perderam, talvez pela falta de educação que os imporiam naturalmente. Parece que se lançam, por adrenalina, dos ares sem paraquedas. Não creio que seja falta de medo ou alienação, mas essa necessidade de tentar ou fazer tudo para suprir uma insatisfação reinante de forma eterna e insolúvel. Nada é o bastante ou suficiente para essa juventude. Não se tratam só de bens materiais, mas também de sensações. Outro dia lia sobre um jogo de sufocamento praticado “on line” pela garotada. Se você acha que expor o corpo na rede é o fim, está atrasado. Hoje se brinca de ir ao limite da vida como gincana. Nem precisa ter prêmio. Percebo uma ansiedade tamanha nesses jovens que me cansa só de olhar. Mas o mais assustador, é que, apesar de todo o esforço envolvido, nada se mostra construtivo ou suficiente. Parecem cachorros a correr atrás do rabo. Preciso trocar ideia com meus amigos psicólogos, pois começo a crer que a juventude virou sinônimo de histeria coletiva. O mais preocupante? Há tantos riscos envolvidos e grande parte dos pais não têm noção do fato, ou não querem tê-la. Sabe a história da negação? Se não sei, não preciso fazer nada e, também, não posso ser responsabilizado depois. Ledo engano! O comportamento inconsequente dos jovens com a omissão, culposa e dolosa, dos pais, são pura nitroglicerina. Mas como a coisa está generalizada, acaba sendo abduzida no campo da normose. Há um sem número de atropelamentos fatais por jovens menores e alcoolizados usando veículos disponibilizados pelos pais; há uma quantidade enorme de situações de risco de morte e morte de jovens por uso de bebidas e drogas, diante de uma falta de acompanhamento pelos pais; somam-se os danos patrimoniais diversos a bens públicos e particulares por jovens sem orientação nem controle familiar; situações de incidentes com armas, que os pais desconhecem estar sob poderia dos filhos, ou que ficam a eles disponibilizadas em casa. Estamos de volta à pré-civilização, mas com tecnologia. Vamos ver no que vai dar. Não faço apostas. Só sei que fui dormir no domingo, me sentindo um pouco culpado por rir de uma situação, ainda que hilária, que certamente deixou os pais do garoto de saias justas.
Autoria: Fernando Sá