“Temos o direito a sermos iguais quando a diferença nos inferioriza; temos o direito de sermos diferentes quando a igualdade nos descaracteriza” (Boaventura de Souza Santos)
Victor Hugo dizia que, “politicamente falando, não há mais do que um princípio – a soberania do homem sobre si mesmo. Essa soberania de mim e sobre mim chama-se Liberdade.” Segundo ele, quando duas dessas soberanias se somavam tinha-se a formação do Estado. Gosto de lembrar esse entendimento, para frisar a visão de que a liberdade traz ao homem uma sensação de que ele pode tudo o que quer, ainda que isto seja um choque com o querer de outros homens. E, se existe tal conflito, perde-se a igualdade, impondo-se o mais forte com sua vontade, ou uma suposta vontade coletiva representada pelo Estado. Consequentemente, a liberdade plena tende a ferir a igualdade de todos. “Garantir que cada indivíduo seja livre para fazer o que desejar inevitavelmente compromete a igualdade.”(Yuval Noah Harari) Não por outra razão, já durante a Revolução Francesa, optou-se por aglutinar a ideia de fraternidade no “slogan”, que passou a ser “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”. Segundo Johann Goethe, os “legisladores ou revolucionários que prometem simultaneamente a igualdade e a liberdade são sonhadores ou charlatães”. E entendo a colocação do cientista e escritor alemão, na medida em que a fraternidade, ou as limitações de direitos e obrigações, devam estar presentes para que a liberdade, pela força, não destrua a igualdade. Mas, diante de eventuais limitações e pela falta de empatia – característica própria à fraternidade, Henri Barbusse explicita que “a liberdade e a fraternidade são palavras, enquanto a igualdade é uma coisa”. Talvez?! Por certo, para a boa vida coletiva, a liberdade deve ter seus limites, a igualdade deve estar preservada e a fraternidade deve mover os cidadãos. O economista Milton Friedman soa radical quando dispõe que “a sociedade que coloca a igualdade à frente da liberdade irá terminar sem igualdade e liberdade”. Mas seu corolário mantém lógica quando diz que “o uso da força para se obter a igualdade vai destruir a liberdade e a força adotada para bons propósitos terminará nas mãos de gente que a usa para promover seus próprios interesses”. Parece que temos visto isso em alguns cenários. Portanto, entendo que liberdade e igualdade devam ser tratadas dentro de um equilíbrio, pois também a igualdade tem seus limites tal qual as desigualdades individuais são sempre presentes. Nada mais inadequado que supor que há igualdade quando se tratam desiguais de forma igual. Como princípios básicos do Estado Democrático e de Direito, tais princípios devem ser vistos com detidos olhos e minúcia. Por isso concordo com Judith Butler no entendimento de que a luta pela liberdade deva estar baseada na igualdade. Nos deparamos, hoje, com lutas que confundem liberdade e igualdade, trazendo ou restrição de direitos ou desigualdade, mas não um resultado que envolva os dois princípios em questão de forma harmônica, no necessário diapasão. Sempre me pergunto se tal situação não é fruto da falta de fraternidade naqueles campos de batalha ideológicos. Mas este problema não é de hoje, no mínimo remonta ao período histórico acima mencionado, se é que não muito antes. Se é verdade que a liberdade e seu aumento são diretamente proporcionais às responsabilidades e seu incremento, também quando falamos de igualdade devemos entender que ela traz uma generalidade. Henry Becque menciona que “o mal da igualdade é que nós só a queremos ter em relação aos nossos superiores”. Pela igualdade plena, todos estão no mesmo patamar. Você não sobe um degrau para manter os outros alguns degraus abaixo. Importante, então, perceber que tanto liberdade, quanto igualdade, comportam direitos e deveres. Uma vez a Dama de Ferro (Margaret Thatcher) disse que: ‘“Liberdade, igualdade, fraternidade” – eles se esqueceram de obrigações e deveres, eu acho. E então, é claro, a fraternidade desapareceu por muito tempo.” Portanto, indubitavelmente tudo isso deve estar dentro de um equilíbrio, que permita existir liberdade baseada na igualdade, dentro de um espírito fraterno, que envolve respeito a direitos e atendimento de obrigações.
Autoria: Fernando Sá
Autores citados: Boaventura de Souza Santos, Victor Hugo, Yuval Noah Harari, Johann Goethe, Henri Barbusse, Milton Friedman, Judith Butler, Henry Becque, Margaret Thatcher