“Feliz de quem entende que é preciso mudar muito pra ser sempre o mesmo.” (Dom Hélder Câmara)
Se é verdade que a vida é mudança, como bem pregava Heráclito, certamente há términos e recomeços nesse caminho. Por isso, podemos falar dos ciclos ou fases da vida. Gloria Hurtado nos lembra que “sempre é preciso saber quando uma etapa chega ao final. Se insistirmos em permanecer nela mais do que o tempo necessário, perdemos a alegria e o sentido das outras etapas que precisamos viver”. Não me restam dúvidas quanto a isso. Podemos lembrar as fases da escola, o período da faculdade, cada relacionamento vivido, viver com os pais e passar a viver por si, … Todos esses períodos caracterizam ciclos da vida, que podem ser consecutivos ou concomitantes. Certo é que, cada ciclo contém um término e o novo ciclo um início, reinício ou recomeço. Nem sempre é fácil. Algumas mudanças são desejadas e se fazem, consequentemente, mais fáceis, ou não; mas há aquelas cujo término é doloroso e o início, ou reinício, exige muita coragem extra. Todavia, isso é viver. Saber viver essas mudanças não exige só vontade ou sapiência, mas também talento. “Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças.” (Leon C. Megginson) Caio Fernando Abreu dizia, com muita sinceridade, que não sabia fechar ciclos, colocar pontos finais. Ele alegava ir “, assim, desse jeito, sem virar páginas, sem colocar pontos…”. Não acho que isso seja bom. Questões não resolvidas e passos não dados, com o tempo, são certezas de sofrimento, angústia, arrependimento, … Todo término de ciclo, para começo de outro, traz pontos negativos e positivos, Richard Hooker fala que as “mudanças nunca ocorrem sem inconvenientes, até mesmo do pior para o melhor”. Por vezes, nem as entendemos de imediato, e a necessidade da mudança vivida se justifica mais à frente, quando analisamos a situação fora do calor do momento. Talvez por isso, Stephen Hawking declara que “inteligência é a capacidade de se adaptar à mudança”. Pode ser. Afinal, por vezes, percebemos a necessidade de mudança, mas não conseguimos explicar por que fazê-las ou o que nos traz tal percepção. “É interessante observar os movimentos de nossas mudanças interiores. Nem sempre sabemos identificar o nascimento da inadequação que gera todo o processo.” (Padre Fábio de Melo) Nunca sei se há mais coragem no término ou no recomeço. Importante que haja a mudança necessária, que faz a vida correr seu curso natural, tal qual o rio que busca o oceano, independente dos caminhos tortuosos que se lhe fazem necessários. Chaplin relata que “cada segundo é tempo para mudar tudo para sempre”. Só posso concordar. Mas, talvez mais difícil que o término do ciclo é o recomeço de outro, quando a coragem se faz necessária; demandada de forma mais viril. Recomeçar é encarar o desconhecido, a incerteza do sucesso, o risco das consequências. Alguns dizem que o recomeço é a prova de que não há fim no ciclo. Discordo, pois isso levaria ao entendimento de que a vida seria um ciclo único, e ela está longe disso. Por isso defendo que saber lidar com a mudança exige talento; há dor no término e incerteza no recomeço, mas a mudança continua necessária. “Chego a chorar, manso de tristeza. Depois levanto e de novo recomeço.” (Clarice Lispector) Nesta mudança de ano, pense quais são os ciclos que você deseja ou precisa fechar, quais os que precisa iniciar. Peça coragem para os recomeços e sobriedade para os términos. Faça nova sua vida no Ano Novo que chega. Assim, seu Ano Novo poderá ser realmente novo, e estarão presentes as palavras de Chico Xavier: “novas folhas, novas flores, na infinita benção do recomeço”.
Autoria: Fernando Sá
Autores citados: D Helder Câmara, Heráclito, Glória Hurtado, Leon C. Megginson, Caio Fernando Abreu, Richard Hooker, Stephen Hawking, Pe Fábio de Melo, Charles Chaplin, Clarice Lispector, Chico Xavier