“Sempre os que dizem de antemão que lutam em nome de Deus são as pessoas menos pacíficas do mundo…” (Stefan Zweig)
Assim, como a tradição não se confunde com conservadorismo, ela também nada tem a ver com fanatismo. A tradição é fruto de uma evolução humana e que permite, com olhar crítico, revisão e mais evolução. Diferentemente, como Diderot já dizia: “Do fanatismo à barbárie não há mais do que um passo.”. Aliás, temos visto isso pelas ruas de nosso país, que agora convive até mesmo com ataques a escolas e tiros contra crianças e professores. Aliás, atente-se que os fanáticos, em regra, agem em grupos ou, individualmente, dentro de condições de covarde superioridade, como no porte de armas contra pessoas desarmadas. Mas Nietzsche já lecionara que o fanatismo é a única forma de vontade que pode ser incutida nos fracos e nos tímidos”. O fanatismo conduz a uma cegueira mental que não permite qualquer visão crítica. Melhor dizendo, gera um maniqueísmo doente, no qual sequer se há possibilidade de qualquer falha do líder ou da causa – dogma da perfeição incontestável. E parece que esse tipo de insanidade se torna permanente e irreversível. Deve se tratar daquela enfermidade incurável (“Quando o fanatismo gangrena o cérebro, a enfermidade é incurável) sobre a qual discorre Voltaire. O fanatismo não mantém qualquer coerência com a própria causa defendida. Por exemplo, pessoas que exigem punições exemplares, se entendem permitidas a prática de crimes com garantia de clemência; em nome e pela ordem praticam a desordem; em nome de uma liberdade individual pregam contra a liberdade; em nome de um Deus universal defendem uma única Igreja; e assim vai. Isso tem se tornado estranhamente comum e aceitável, como bem colocado por G. K. Chesterton, “um estranho fanatismo preenche nossos dias: o ódio fanático contra a moral, especialmente contra a moral cristã”. Perceba que o uso do nome de Deus se dá em vão contra as próprias escrituras, mas também se inferioriza esse Deus, dando ao diabo poder igual ao Dele. Ilógico, contraditório, estranho? Só percebe isso quem avalia; o fanático não avalia, ele segue. Mesmo que se entenda que o fanatismo seja mais próprio aos fracos e menos evoluídos intelectualmente, sua vivência parece uma opção absurda a qualquer um. Todavia, parafraseio Vitor Durão, para quem “a pior cegueira humana é a falta de visão crítica”, e que permite que o fanatismo escureça o discernimento. Por isso, nas palavras de Antônio Prates, “o fanatismo e a inteligência nunca moraram na mesma casa”. Não por outra razão, fanatismo e preconceito são companheiros de existência. A diversidade é inadmissível ao fanático, pois ela traz risco ao seu dogma pela possibilidade do questionamento, da reflexão, da ponderação, da comparação. Fanatismo e preconceito vivem nas trevas e odeiam a luz. Iacona trata disso (“Assim como o preconceito, o fanatismo deixa a pessoa cega e surda. Só se permite ver o que lhe interessa e ouvir o qu e lhe agrada.”), indo além com sapiência ao lembrar que, quanto ao fanático, “as opiniões de seus interlocutores não lhe interessam”, pois ele “quer ser ouvido, mas jamais ouvir”. Outro ponto de atenção é que o fanatismo tende a se basear em coisas “vencidas” ou ultrapassadas pela própria evolução, o que por si só já o afasta da ideia de tradição. “Uma ideia morta produz mais fanatismo do que uma ideia viva; ou melhor, apenas a morta o produz. Pois os estúpidos, assim como os corvos, sentem apenas o cheiro das coisas mortas.” (Leonardo Sciascia) Por isso tudo, todo fanático é um uma pessoa chata, inconveniente e desagradável. O fanático gera uma ave rsão tamanha, que possibilita inclusive certas construções de estereótipos a ele e seus grupos. Os fanáticos irão angariar às suas fileiras mais tantos fracos e insanos, mas nunca espíritos mais evoluídos pela luz do livre arbítrio.
Autoria: Fernando Sá
Autores citados: Stefan Zweig, Denis Diderot, Friedrich Nietzsche, Voltaire, G. K. Chesterton, Vitor Durão, Antônio Prates, Francis Iacona, Leonardo Sciascia