“Gosto de estar comigo mesmo. Sou a melhor forma de entretenimento que posso encontrar.” (Charles Bukowski)
Sempre alerto, e com fundamento dogmático e pragmático, que a vida exige equilíbrio. Assim, se o trabalho é deveras importante por diversas razões, nem somente pelo manter-se, mas também é importante o lazer. Infelizmente, há pessoas e grupos que vêem o entretenimento como algo culpável, um tanto pecaminoso. Talvez a origem disso esteja em algumas visões fundamentalistas, como a de C H Spurgeon no sentido de que “prover entretenimento está em direto antagonismo ao ensino e à vida de Cristo e de seus apóstolos. Qual era a atitude da igreja em relação ao mundo? Vós sois o sal, não o docinho, algo que o mundo desprezará”. Essa visão, sob meu ver, estreita e opaca, parece ter tido um efeito colossal. O próprio Baudelaire, em tom de arrependimento, disse que queria representar uma diversão inocente, pois haveria “poucos divertimentos que não sejam culpáveis”. Atentem que, por vezes, entretenimento é forma de educação e aprendizado e basta lembrarmos das fábulas e contos com que fomos brindados na infância, nas músicas que permearam nossas vidas, pelos livros que lemos, pelos filmes que assistimos, pelas experiências a partir de peças teatrais, festas e encontros. “As letras das músicas podem ensinar algo às crianças. Não é apenas diversão.” (Bob Marley) Em uma de suas obras Arthur Conan Doyle descreve uma personagem e menciona que ela “não apreciava música como simples entretenimento”, mas como uma ajuda à reflexão. E a diversão de cada um será peculiar, conforme são peculiares as características que as individualizam dentro do grupo social. Gostos diferentes e usos diversos. Eu, por exemplo, amo a leitura, o teatro, os filmes e os bate-papos. Parafraseando Stephen King: “Os livros são o entretenimento perfeito: sem anúncios, sem bateria, horas de prazer a cada dólar gasto. O que não entendo é porque as pessoas não têm sempre um livro com elas, para aquelas inevitáveis zonas mortas da vida.”. Ultimamente, tenho tido cautela e me corrigido, pois precisamos ter respeito também pelos gostos das pessoas, ainda que não sejam os nossos ou da maioria. Por exemplo, eu abomino “reality shows”, e outro dia fui grosseiro com uma excelente amiga que deles gosta. Depois, pedi desculpas. Cada cabeça uma sentença! O problema é quando o entretenimento sai da esfera do equilíbrio e se torna o foco do indivíduo, sua vida. Ele pode se tornar um vício. Hoje nos deparamos com os viciados em redes sociais. E tal qual os viciados em drogas e álcool, na maioria das vezes, não reconhecem o vício. O vício moderno das redes sociais traz problemas ao trânsito, às atividades laborais, aos estudos, …, mas também tem deteriorado as relações pessoais sejam familiares, amorosas ou fraternais. E nesse caminho recordo a lógica contida em uma frase de Augusto Cury: “A indústria do entretenimento explode desenvolvimento e a indústria dos tranquilizantes explode em crescimento.”. O nível de ansiedade das pessoas com o vício nas redes sociais é marcante. Prova disso? Vejam no trânsito os comportamentos a cada sinal fechado. São poucos minutos, mas as pessoas precisam verificar se algo aconteceu nas redes nos últimos 5 minutos. Vejam também as pessoas nos engarrafamentos. E nem vou citar a questão dos acidentes. Acredito que hoje o acompanhamento das redes sociais cause mais acidentes que a embriaguez. E novas seitas surgem com os autodenominados “influenciadores”, que formam grupos de seguidores ensandecidos e, na maioria das vezes, sem senso crítico sobre o que seguem. Um tipo de talibã digital. Você talvez perceba como estranho isso parece ou pode se surpreender por nunca ter percebido tal fato. Ou mesmo, pode reconhecer que você está viciado e influenciado. Como lecionou Arthur Conan Doyle, “a vida é infinitamente mais estranha que qualquer coisa que a mente humana possa inventar”. Mas, me arrisco a palpitar: todos são felizes nas redes sociais e competem nelas, para se mostrarem mais felizes ainda que os outros, bem como, todos querem culpar alguém por suas decisões, supostamente influenciadas, sem responsabilidade própria por suas escolhas. Um show de realidade irreal, praticado com infantilidade, egocentrismo e leviandade. Mas o show tem continuar! Será mesmo?