CULTIVAR PARA DAR FRUTO, ASSIM SE MANTÉM A AMIZADE.
“As coisas que fazem a amizade ser o que é: fazer gentilezas, fazê-las sem ser convidado, e não proclamar o fato de tê-las feito”.” (Aristóteles)
Há quem fale que os gregos antigos previam 7 ou 8 formas de amor, mas prefiro me juntar aqueles para quem os sábios viam o amor sob apenas 3 aspectos mais relevantes (eros, philia e ágape), onde “philia” pode ser entendido como amizade. A amizade foi sempre objeto de loas e elocubrações no tempo, nos deparamos com isso desde a Antiguidade, quando Platão (“A amizade é uma predisposição recíproca que torna dois seres igualmente ciosos da felicidade um do outro.”), Aristóteles (“A amizade é uma alma com dois corpos.”) e Pitágoras (“Os amigos têm tudo em comum, e a amizade é a igualdade.”) sobre ela filosofavam. Não podemos negar que os amigos formam o maior tesouro que um homem pode ter. Esses são os verdadeiros ativos de sua riqueza. Mas, aqui, quero me deter a outro aspecto, que é como manter viva a amizade no curso do tempo; como cultivar a amizade; como manter e manter-se cativo ao amigo. A mencionada “philia” já dava, no seu significado, as primeiras dicas, pois tratar-se-ia de um sentimento de amor onde está englobada lealdade, sinceridade, reciprocidade, pureza, hospitalidade, … Isso faz da amizade algo útil e agradável e, como tal, cativante. Há, pois, que se cuidar da amizade. E já dizia o poeta Drummond, “como as plantas, a amizade não deve ser muito nem pouco regada”. Essa preocupação, muito claramente explorada por Antoine de Saint-Exupéry, em “O Pequeno Príncipe”, não está só no pensar dos filósofos, mas no nosso dia-a-dia. E pela amizade ser verdadeira o Príncipe diz: “Se você vier às quatro da tarde, por exemplo, começarei a ser feliz desde as três.”. A amizade proporciona essa sensação agradável de querer estar junto, mas também de estar junto mesmo quando se está distante; aquele pensamento sobre reencontrar o amigo após longo tempo, mas sentir como se tivesse sido ontem o último encontro. Como cultivar esse sentimento para que a flor da amizade nunca murche? A amizade exige que sejamos respeitosos, mesmo quando discordamos; que sejamos ciosos da felicidade do amigo; que o defendamos quando for necessário; que tenhamos um abraço quando palavras de nada servem. Agindo assim, seremos leais, sinceros, recíprocos, puros e hospitaleiros, ou seja, amigos. Quando faltam tais características e comportamentos há que se perguntar se realmente vivemos uma amizade. Amizade não é caminho de mão única. Não é uma postura individual, onde um somente dá e outro somente recebe. “A verdadeira amizade pode basear-se somente na união de modos de ser semelhantes.”(Ludwig van Beethoven) Precisamos perseverar na amizade sempre; estar ao lado mesmo na distância; ser o farol no mar revolto; ser o vento no velejar calmo. Parafraseando Shakespeare, “quem negligencia as manifestações de amizade, acaba por perder esse sentimento”. A amizade traz uma igualdade de querer bem, razão das palavras de Platão (Onde não há igualdade, a amizade não perdura.) e Aristóteles (“A amizade pode existir entre as pessoas mais desiguais. Ela as torna iguais.”) Não se trata da igualdade de condições ou comparativa, mas a igualdade de desejar o melhor ao amigo. Jean Cocteau nos lembra: “A felicidade de um amigo deleita-nos. Enriquece-nos. Não nos tira nada. Caso a amizade sofra com isso, é porque não existe.”. Estamos falando de lealdade, respeito e reciprocidade, por isso, nas palavras de Jô Soares, “não há amizade, por mais profunda que seja, que resista a uma série de canalhices”. Compreende-se os pequenos defeitos e as escorregadelas, mencionados por Jean de la Bruyere, mas não há espaço para a deslealdade e o desrespeito. A amizade exige exercício, como leciona Simone Weil. Exercitá-la, nos parâmetros aqui mencionados, é o que rega, aduba, e faz florescer e seguir florida. Não se pode permitir a exemplo do que dizia Platão, que nela cresçam ervas daninhas. A amizade traz a confiança que não deve ser rompida sob pena de nunca mais se refazer. “A confiança perdida é difícil de recuperar. Ela não cresce como as unhas.” (Johannes Brahms) Um dos principais sinais de caráter de um homem se comprova pelos amigos que tem e como mantem tais amizades de forma pura. Ser um bom amigo é uma das principais virtudes de um homem. “A amizade, depois da sabedoria, é a mais bela dádiva feita aos homens.” (François La Rochefoucauld) Precisamos refletir muito sobre como tratamos e somos tratados nas relações de amizade. Isso é sinal de apreço pelo amigo e de autorrespeito.
Autoria: Fernando Sá
Autores citados: Aristóteles, Platão, Pitágoras, Carlos Drummond de Andrade, Antoine de Saint-Exupéry, Ludwig van Beethoven, Shakespeare, Jean Cocteau, Jô Soares, Jean de la Bruyere, Simone Weil, Johannes Brahms, François La Rochefoucauld