“Sinto-me como uma semente no meio do inverno, sabendo que a primavera se aproxima.” (Khalil Gibran)
As estações do ano são mais marcantes em alguns lugares que em outros. E isso faz com que elas tragam sensações e percepções muito diversas nas pessoas. Visto que o inverno sempre foi uma estação muito rígida em certos países, evocando inclusive, muitas vezes, uma clara necessidade do instinto de sobrevivência, a ele foi decretado um certo negativismo. São os invernos desesperadores e sofridos de Dickens. E isso culturalmente foi incorporado mesmo naqueles locais tropicais, onde as estações nem são tão definidas, nem há rigorosos invernos. A preferência pelo inverno passa então a ser algo deveras estranho. Sempre que falo dessa minha preferência, percebo um tom de reprovação, um olhar de dúvida. E logo imagino a pessoa, consigo mesma, me julgando como esquisito. Isso, em parte, demonstra essa dificuldade das pessoas quanto ao equilíbrio, bem como, a necessidade de viverem nos extremos, um forma maniqueísta de ser. Na verdade, como dizia Anne Bradstreet, “se não tivéssemos inverno, a primavera não seria tão agradável: se não experimentássemos algumas vezes o sabor da adversidade, a prosperidade não seria tão bem-vinda”. As pessoas entendem que o inverno, em razão do frio, traz consigo uma interiorização nas casas, um envergamento do corpo que tenta se aquecer, um isolamento social, um desconforto pelo excesso de vestimentas, uma introspecção, … Entende-se, então quando Victor Hugo repisava que “a gargalhada é o sol que varre o inverno do rosto humano”. Mas não precisa ser assim. Aliás, esse mesmo autor vai professar que: “O inverno cobre minha cabeça, mas uma eterna primavera vive em meu coração”. O inverno é só parte de um ciclo, de onde se percebe que tudo passa e a tudo se retorna; tudo se vence e tudo se reenfrenta. O inverno pode ser a oportunidade de aprendermos a estar realmente juntos na intimidade das conversas reveladoras, do riso frouxo advindo do vinho, da vivência do pecado na gula coletiva, … Também deve ser o tempo de ter empatia pelos menos validos, a partir de uma visão real da realidade de entorno. Hora de aprofundar a leitura, as idas ao teatro e ao cinema, …; curiosidade cultural. No inverno, como em qualquer estação e a qualquer tempo, podemos ter a experiência do autoconhecimento. “E no meio de um inverno eu finalmente aprendi que havia dentro de mim um verão invencível.” (Albert Camus) As estações deveriam ser um sinal de aprendizado, no sentido de que vida é mudança, nada resiste, tudo se transforma. Cantarolar com Milton Nascimento: “Sei que nada será como antes, amanhã”. Precisamos entender a transformação e a mudança, assim como o equilíbrio, para a medida da vida boa. Não importa sua estação preferida, mas que sua vida seja boa seja qual for a estação, pois você fez da sua vida uma vida boa. “Quando as pessoas são felizes, não reparam se é Inverno ou Verão.” (Anton Tchekhov) Bem, mas “agora é inverno e no mundo uma só cor; o som do vento” (Matsuo Basho).
Autoria: Fernando Sá
Autores citados: Khalil Gibran, Anne Bradstreet, Milton Nascimento, Victor Hugo, Albert Camus, Anton Tchekhov, Matsuo Basho