“A ilusão é o primeiro de todos os prazeres.” (Voltaire)
Normalmente ouvimos dizer que fulano é iludido ou beltrano se ilude. Outras vezes acredita-se que ilusão é somente um sonho, ainda que possa se aproximar mais do delírio ou devaneio. Na verdade, a ilusão é o engano dos sentidos ou da mente, que faz com que se interprete erroneamente um fato ou uma sensação. Assim, há a troca da aparência real por uma ideia falsa. Ela possui a capacidade de ofuscar a razão para que não se possa discernir a realidade dos fatos. Consequentemente, ser iludido é ser enganado. Viver uma ilusão significa viver um engano, viver uma percepção falsa da realidade. “A ilusão nos engana justamente fazendo-nos passar por uma percepção autêntica.”(Maurice Merleau-Ponty) Muitas vezes, a ilusão não surge da ação externa que visa nos enganar, mas da própria fuga de uma realidade que não se consegue encarar ou modificar. Balzac preconizava que “a ilusão é uma fé desmedida”. Não deixa de ser, pois, memo quando as pessoas se iludem, elas criam uma situação que lhes permite uma percepção adversa da realidade, mas cuja existência exige profunda crença. A pessoa cria uma situação falsa e nela acredita profundamente. Geralmente, a ilusão traz a percepção de que tudo é ou será diferente, mas melhor. Entende-se a razão pela qual Voltaire fala que a ilusão é o primeiro de todos os prazeres”. A ilusão irá garantir uma situação melhor onde, em tese, inexistiria frustração, infelicidade, … Mesmo em situações de ilusão sobre comportamentos contrários pelo iludido, há certa valorização do ego, pois a ilusão traz em si uma autopercepção de importância, beleza, uma condição de desejo. “O ego certamente é uma ilusão.” (Deepak Chopra) E cabe aqui se perguntar sobre a precisão de argumento de Henri Amiel, para quem “a nossa maior ilusão é acreditar que somos o que pensamos ser”. Portanto, podemos estar iludidos por um ato de terceiro ou estarmos iludidos por uma opção própria, nela aceitamos, ainda que obviamente ilógico o infundado, o ato do terceiro ou uma situação que criamos para distorcer uma realidade da qual não gostamos ou justificar uma alteração de realidade improvável. Em qualquer das hipóteses, a ilusão traz, ao final, muita frustração. Muitas vezes uma frustração invencível, dependendo o quanto a ilusão substituiu a realidade ou uma solução para ela. Ao contrário de haver libertação pelo fim da ilusão, algumas pessoas têm tal frustração que não mais conseguem sequer viver sem a ilusão. “O prazer pode apoiar-se sobre a ilusão, mas a felicidade repousa sobre a realidade.” (Sébastien-Roch Chamfort). Saber encarar a realidade e atuar para mudá-la, quando não nos é agradável, ou melhorá-la, quando já nos é agradável, envolve saber viver e ser feliz. A ilusão imposta por terceiro – mentira – ou autoimposta – fuga – nos afasta da vida boa, da plenitude. Portanto, o fim das ilusões seria um caminho de felicidade e não de tristeza. Santo Agostinho lembra que “a vida feliz reside na plenitude e na medida”. Só podemos concordar com Ludwig Borne ao lecionar que “perder uma ilusão torna-nos mais sábios do que encontrar uma verdade”. Nesses tempos difíceis em que vivemos, a ilusão é uma armadilha. Ela se torna a armadilha de quem promete salvação seja no mundo religioso, por milagres, ou na política, por soluções mágicas. A ilusão não é só um mal que fazemos a nós mesmos, mas gera males que permitimos nos sejam infringidos, como nas situações de manipulação. A consciência da realidade é o caminho a ser trilhado. Os sonhos têm seu lugar, mas não os devaneios e as ilusões.
Autoria: Fernando Sá
Autores citados: Voltaire, Maurice Merleau-Ponty, Honoré de Balzac, Deepak Chopra, Henri Amiel, Sébastien-Roch Chamfort, Santo Agostinho, Ludwig Borne