“Jurei a Constituição, mas ainda que não a jurasse, seria ela para mim uma segunda religião.” (D. Pedro II)
A primeira constituição brasileira adveio após a independência, mais precisamente em 25.03.1824; e por isso em 25 de março se comemora o “Dia da Constituição”. Era uma Constituição liberal e que teve longa vigência. As constituições são as certidões de nascimento do país, inclusive lhe dando nomes. Aquela denominava nosso país como Império do Brazil. Mas as constituições não são documentos modernos. Podemos vê-las já no período imperial de Roma, quando, inicialmente eram um conjunto de regras, princípios e diretrizes, não totalmente escritos, que eram praticados de fato pelos imperadores romanos. E essa semente germinou na forma da “Constituição Imperial”, durante o Baixo Império Romano (século III d.C). E a história veio trazendo novas constituições conforme os países foram se formando ou criando regras de organização política. Por exemplo, lembramos da Constituição americana de 1787, da francesa de 1791, e da espanhola de 1812. Mas vamos nos ater a Constituição vigente no Brasil e promulgada em 05.10.1988. Ela nos nomeou República Federativa do Brasil e foi fruto de uma Assembleia Nacional Constituinte formada por deputados e senadores eleitos para tal fim. Ela é hoje muito atacada e mesmo vilipendiada, mas precisamos entender sua importância e a razão de suas características. Países com maturidade política, social e econômica tendem a ter constituições simples, curtas e com princípios gerais, a exemplo da americana. Essa maturidade não é uma característica do Brasil ainda hoje, agravado pelo fato de que a Constituição surgia como sopro de liberdade após anos de tirania militar. E uso o termo tirania, pois, com fundamento na Ciência Política, o movimento de 1964 não foi uma revolução e sim um golpe de estado. Além disso, o que difere uma tirania de uma ditadura é a existência, ou não, de um plano de governo para o país. Vargas foi um ditador. O movimento de 1964 não tinha qualquer plano de governo, ele tão-somente visava garantir interesses, mesmo que obscuros, de determinados grupos. Feito tal parêntese, a constituição de 1988 acabou sendo extensa, detalhista, abarcando assuntos fora do âmbito constitucional típico, … Mas ela era a chance naquele momento de permitir o retorno ao estado social e de direito, que nos fora subtraído em 1964. Com falhas sim, mas foi um suspiro, uma baforada de ar para um país afundado nas trevas, no retrocesso, nas mentiras e falcatruas. Talvez não tenhamos melhorado tanto, mas com ela tudo pode ser exposto pela mídia e questionado pelos cidadãos, como não podia sê-lo antes. A constituição cidadã de 1988 quebrou nossos grilhões e nos restituiu a condição de cidadãos. Eu vivi sua criação e assisti seu nascimento nos bancos da faculdade de direito. O tempo passou. Como dizia Thomas Jefferson: “Nenhuma sociedade pode fazer uma constituição perpétua, ou sequer uma lei perpétua.” São mais de 30 anos de vida e, por suas características, ela não está atualizada em diversos aspectos. Ela também foi retalhada principalmente por governos mais preocupados com interesses econômicos específicos do que com princípios sociais e políticos. Não sei se é tempo de uma nova constituição, mas nunca será tempo de atacá-la de forma ignorante e ignóbil como hoje assisto. Não perderei tempo citando Presidentes que a juraram, para depois insultá-la e desrespeitá-la. E aí entende-se algumas diferenças quando nos deparamos com as palavras de Zachary Taylor (“No cumprimento de deveres meu guia será a Constituição, que eu este dia jurei conservar, proteger, e defender.”) ao tomar posse como presidente dos Estados Unidos. O grande problema, aqui, está no fato da manutenção de uma oligarquia política venal, com interesses (im)próprios e falsos comprometimentos ideológicos. O Brasil precisa mudar a partir da limpeza da classe política. Sem isso, de nada adianta uma nova constituição. Comprar esse slogan é fazer o jogo de quem continuará agindo contra e ferindo a Constituição – velha ou nova – mesmo tendo jurado respeitar a mesma. Talvez seja tempo de refletir os versos de Renato Russo: “Nas favelas, no senado, sujeira pra todo lado! Ninguém respeita a Constituição, mas todos acreditam no futuro da nação.“
Autoria: Fernando Sá
Autores citados: D. Pedro II, Thomas Jefferson, Zachary Taylor, Renato Russo