Todo dia, às 6:45h, pontualmente, ele aparecia para o café. Mesmo em dias nublados, era como se o sol, em pessoa, entrasse por aquela porta. Seu andar era sempre em câmera lenta para mim. O frescor da sua pele dava vida ao perfume das minhas manhãs. Preto, sem açúcar, e um australiano; já havia decorado. Depois do pedido, vinha o meu bom dia. Um hálito de hortelã em lábios rosados. Eu salivava sempre e me umedecia antes de responder, encarando-o no fundo de seus olhos; queria vê-lo do avesso. Os pelos da sua nuca me causavam arrepios, mesmo sem poder beijá-los. Deixava meu braço o mais perto possível para sentir seu calor e, quando nos esbarrávamos, tinha que esconder meu desejo em forma de volume sob as calças. Era impossível não sentir uma onda percorrendo o meu corpo. Seu tapinha nas minhas costas ao se despedir era o momento mais esperado. Queria congelar esse momento e não sair mais dele. Queria mais daquela mão em meu corpo. Minha cabeça sempre acompanhava seus passos, por todo o percurso da saída. Meu suspiro de despedida parecia que iria me tirar todo o ar dos pulmões. Mas, àquela hora, era o momento de voltar a sonhar com a manhã seguinte. Então, me apoiar na bengala e andar torto de cabeça baixa, entre aqueles que me ignoravam, só era suportável pelas manhãs que ele me proporcionava, de puro desejo.