POR SER NATAL …
“Honrarei o Natal em meu coração e tentarei conservá-lo durante todo o ano.” (Charles Dickens)
Sempre que falo de minha infância cito o Natal, e vocês já devem ter percebido isso. O Natal sempre foi uma época especial, não pelos presentes, mas pela decoração e histórias. Arrumar a árvore, planejar o cardápio da ceia, colocar luzes pela casa, …, sempre foram oportunidades de ouvir dos meus pais e avós como eram os seus saudosos natais. Um festival de histórias que envolviam cheiro de maçãs, rabanadas de vinho, pequenas bolsinhas bordadas com moedas, velas, sinos e também vara de correção nas mãos de Papai Noel. Eu tinha, ou tive, diferentes natais, mas todos na busca de um propalado Espírito de Natal, que me soava como uma justificativa decembrina para todos serem mais humanos e tratarem os demais com empatia. “O Natal não é um momento nem uma estação, e sim um estado de espírito. Cultivar a paz e a boa vontade, ter misericórdia em abundância, isso, sim, é ter o verdadeiro espírito de Natal.”(Calvin Coolidge) O Natal com meu pai era uma grande festa – bem como ele gostava. Havia muita comida, muito riso, e nos momentos de emoção, muitos olhos marejados. Havia os “long plays” (LPs), que, na vitrola, tocavam músicas de Natal, das mais lindas às mais tristes. Uma, em especial, fazia doer o coração, pois falava de um menino pobre que esperava sem receber seu presente (“… felicidade é presente que não tem.”). Havia uma outra festa de Natal, essa na casa de Tia Elisa – a tia preferida de meu pai. Era uma festa grande, com muitos filhos e netos. Sempre passávamos lá após a ceia em nossa casa. Aliás, íamos a várias casas, quase até o amanhecer. (Não tinha “blitz” de Lei Seca, graças a Deus!) Chamávamos essas visitas de “Cantar Reis”. Acabávamos por encontrar e reencontrar Papai Noel por diversas casas. Afinal, como dizia G. K. Chesterton, o “Natal é feito de um belo e intencional paradoxo; que o nascimento do desabrigado deve ser comemorado em todos os lares.” Havia, ainda, uma outra festa de Natal. Tia Margarida Ulrich (Tante Gretel) – minha professora de alemão – fazia uma celebração onde todos os seus alunos se encontravam, acompanhados dos pais. Não era só um cardápio alemão. (Senti agora o cheiro da Torta de Sementes de Papoulas!) Havia apresentações, declamações, … e tudo terminava com todos cantando “Die Tannenbaum” (O Pinheirinho de Natal). Em dezembro, mais que as aulas e o sofrer com as declinações, eu amava o tempo de montar a Coroa de Advento (Adventuskranz) e o Calendário do Advento (Adventuskalender). Quanto a este último, a dúvida envolvia chocolates ou balas nas 25 janelinhas (de primeiro a 25 de dezembro). Mas, a Coroa de Advento ainda inspira questionamentos sobre as cores das velas, exceto da vela rosa para o terceiro domingo (Domingo Gaudete), na comemoração da anunciação do anjo à Nossa Senhora. Em casa, sempre optamos pelas quatro cores: roxa (caos), verde (esperança nas palavras dos profetas), rosa (anunciação) e branca (o próprio Advento do Senhor). E o tempo passou … Havia festa em torno da árvore gigante, que exigia retirada de metade dos móveis da sala, coberta de luzes e enfeites vindos do mundo todo, … A família é pequena, não há crianças, e o tempo diverso. Ainda amo o Natal! Mas hoje a data é menos festiva. Em família, optamos por um jantar de poucos pratos, após assistirmos presencialmente à Missa da Vigília. Trocamos presentes! E eu, normalmente, me recolho com a taça de vinho para pensar naqueles que não mais estão e naqueles que ainda estão, geralmente ao som do Kyrie, da missa solene de Beethoven. Aliás, Beethoven era um nome cuja pronúncia sempre me era corrigida por Tante Gretel. O meu Natal hoje é uma data reflexiva e de repensar meu comportamento, na busca de evolução enquanto pessoa. Pode parecer muito lúgubre, mas esse conceito de que Natal seja Carnaval envolve uma analogia que não alcanço. Meu Natal é um ritual que me liga a Deus, para me concentrar na Sua intenção de se corporificar no Cordeiro. E há, ainda, um outro Natal, que envolve um almoço ou um jantar com um grupo sempre presente de amigos – essa outra família meio louca que me faz muito feliz. E para cada um deles cabe o poema de Van Dike:
“Eu estou pensando em você hoje porque é Natal, e eu lhe desejo felicidade.
E amanhã, porque será o dia seguinte ao Natal,
Eu ainda lhe desejarei felicidade
Eu posso não ser capaz de lhe falar sobre isto diariamente,
Porque eu posso estar ausente, ou nós podemos estar muito ocupados.
Mas isso não faz diferença.
Meus pensamentos e meus desejos estarão com você da mesma forma.
Qualquer alegria ou sucesso que você tenha, me fará feliz. Me iluminará por todo ano.
Eu desejo a você o Espírito do Natal.”
A você, eu desejo esse mesmo Espírito de Natal, em uma data para refletirmos sobre a necessidade, independente de religião, mas por humanidade, de viver o exemplo de vida do menino santo, cujo nascimento se comemora no Natal.
Autoria: Fernando Sá
Autores citados: Charles Dickens, Calvin Coolidge, G. K. Chesterton, Beethoven, Van Dike.
Foto: flickr.com
dace Kirspile