“A natureza une em si Deus e o homem.” (Baruch Spinoza)
Quando criança, compreendi o que me falavam acerca do Deus – eterno criador de tudo! Havia uma pergunta que me intrigava e deixava meus pais, professores e instrutores desconfortáveis por ouví-la de uma criança: “- Porque Deus fica em silêncio?”. A possibilidade de que Ele não falasse nossa língua ou que nós não O entendêssemos, devido à nossa pequenez, me foi explicada diante de um formigueiro por um professor. Ele me incentivava a falar e até gritar com as formigas, e eu via que elas não alteravam o seu caminho por causa do som da minha voz. Ainda, o professor aproveitou para me explicar a necessidade da encarnação de Cristo: “- Se eu e você nos tornássemos uma formiga certamente elas nos ouviriam.”. Foi um bom argumento! Mas a pergunta persistia! Mais velho, e mais questionador, voltei a ponderar sobre o silêncio de Deus, e, desta vez, meu líder religioso tratou de colocar o adolescente questionador em seu devido lugar: “- Os seus pecados fazem separação entre vós e o vosso Deus” (Isaías 59:12). E mais uma vez o silêncio reinou! Já adulto, entendi que é possível ouvir a voz de Deus de diversas maneiras; por vezes de forma mais tranquila, como pela natureza e pelas escrituras que revelam Deus, e por outras de forma mais controversa, como mediante o fenômeno profético – Deus falando por outras pessoas. Êxtases são comuns em diversas religiões, mas esse falar de uma entidade espiritual ou sacra por meio de um homem se tornou algo comum, ou até um modismo, visto que a comunicação direta seria muito mais buscada pelos fiéis, nos dias atuais. Mas isso não tem nada a ver com ouvir a voz de Deus no particular, sendo, assim, apenas uma mensagem apresentada por um oráculo e não uma manifestação direta de Deus com os fiéis. Mas Deus ouviu este meu desejo de ouví-Lo e que ecoava desde os tempos de Abraão, Moisés e Jó. Deus respondeu esse desejo atemporal em Cristo e no Espírito Santo, especialmente enviado no dia da cerimônia judaica do Pentecoste. Porém, se Cristo hoje está à direita do pai e o Espírito em nossos corações, é certo que nossas orações são o meio de falar ao Criador, mas, ainda assim, Sua voz faz falta quando, ao final da oração, o silêncio nos rodeia. Ele nos incentiva a persistir no silêncio, pois, “A intimidade do Senhor é para os que O temem, aos quais Ele dará a conhecer a sua aliança.” (Salmos 25:14). E, nessa certeza de que há um caminho para ouvir a voz de Deus cruzando o silêncio, me ocorreu algo muito racional e nada místico! Temos o bem e o mal desde a criação. Mas quem ama esse bem e esse mal? Reformulando, quem amaria um estuprador, ou um assassino, ou o maior corrupto responsável pela miséria e fome da população? Eu respondo, um pai e uma mãe. Mesmo concordando com todas as penas e punições que seus filhos mereçam, ao se perguntar a um pai ou uma mãe o que ele deseja para aquele filho, ouviremos palavras de amor, compaixão e misericórdia. Nas palavras de Santa Teresa de Ávila: “Uma prova de que Deus esteja conosco não é o fato de que não venhamos a cair, mas que nos levantemos depois de cada queda.” Sim, é por isso que vejo Deus em silêncio. Se Ele começasse a argumentar, para que o amor fosse o crivo das nossas ações para com as pessoas ao nosso redor, nos irritaríamos com Ele muito rápido. Tal qual o irmão do filho pródigo da parábola de Jesus (Lucas 15:24), voltaríamos contra esse desvairado que deixou a fartura da casa do pai para terminar pobre em chiqueiros comendo das sobras das lavagens dos porcos. Uma festa para um ser assim? Nem de filho de Deus deveria ser chamado, quanto menos de irmão. Todavia, Deus, serenamente, nos abraça e explica que temos tudo, enquanto alguns irmãos estão mortos, ainda que pareçam vivos, e devemos estar na expectativa de que revivam! Deus nos fala, todo dia, a amar ao nosso irmão como a nós mesmos. Então lembrei quando ouvi: “Eu te amo como você é!” Mesmo sabendo que poderia ser esquizofrenia, eu ouvi! Naquela hora, não passei a me amar de imediato, pois esse processo tem sido longo. Contudo, a partir daquele momento, eu compreendi que Deus fala quando nós realmente precisamos! E o amor prova, no silêncio, toda a Sua fidelidade, todo Seu olhar de mansidão, todo Seu carinho em cuidar dos detalhes, para nos aperfeiçoar no serviço daqueles que não conhecem o amor dEle. Assim ao conhecer esse amor de Deus uma vez, nunca mais será um completo silêncio. “O amor é a asa veloz que Deus deu à alma para que ela voe até o céu.” (Michelangelo)