O NOME DE DEUS
“O Deus que me chama é Amor” (São Luiz Gonzaga)
A existência de Deus não é, por si só, uma polêmica. Talvez tal qual a capacidade, o direito e a diversidade de crer, há bastante confusão sobre o próprio nome de Deus. Na Bíblia há, no mínimo, 72 citações a Deus com o uso de nomes diversos, por exemplo: ELOHIM, ELÔAH, EL, ELION (Altíssimo), SHADAY (Onipotente), ADONAY (Senhor) e YAHVEH (Ele faz existir). Os três primeiros significam Deus, os quais, com ELION, SHADAY e ADONAY, caracterizam mais títulos, que o próprio nome de Deus. O nome pessoal de Deus seria YHWH (YAHVEH, Javé ou Jeová). Trata-se de um nome que vem do verbo “havan” (existir), sendo o mais citado no Velho Testamento (TANACH). Existe toda uma questão envolvendo a matéria, pois no Êxodo (20.7) está estabelecido, como mandamento, “não falar o nome de Deus em vão”. Por isso, a partir do século III, a.C., os judeus não mais pronunciaram o nome de Deus (YAHVEH). Mesmo na leitura dos textos bíblicos, o nome Jeová é substituído por ADONAY. Isso influenciou as traduções de tais textos. No grego, se usava o termo KYRIUS, enquanto que, no latim, se usava a palavra DOMINUS. Isso trouxe, em traduções para o português, o uso de “Senhor” e, algumas vezes “Adonay”. Na verdade, a palavra Deus não seria seu nome, mas sua designação (título), pois vem do grego THÉOS (divindade). Talvez o nome de Deus não seja tão importante, pois, ao se manifestar pelo profeta Isaías (52:6), Ele disse: “O meu povo saberá o meu nome.” Dessa diversidade de nomes para Deus decorrem as dezenas de designações da Cabala, onde cada uma, mais do que um nome, é uma forma de chamamento que traz consigo uma finalidade, um anjo de proteção e um salmo de louvor. Aos 50 anos, em meio a uma crise de ansiedade por força de contínuo assédio moral no trabalho, percebi que só me restava a fé, a qual, uma vez perdida, me privaria da razão de viver. Em um momento de desespero, e salvo pelo aconselhamento de um padre, em confissão, decidi que Deus deveria estar marcado fisicamente em mim. E assim surgiu uma tatuagem com o 11º nome de Deus (Lamed Alef Vlav) na Cabala, ou seja, adotei o nome pelo qual se expulsam os resíduos do mal, retira-se o peso da vida e purifica-se o ambiente. Trata-se de um nome pelo qual se chama Deus para o fim de se ter um ambiente limpo do mal. Essa vinculação a Deus não importa necessariamente em participação em uma ou outra igreja ou seita, porquanto a forma de entender Deus é subjetiva e deriva da fé, ou seja, um sentimento de total crença em algo ou alguém, ainda que não haja nenhum tipo de evidência que comprove a veracidade da proposição em causa. Ter fé implica uma atitude contrária à dúvida e está intimamente ligada à confiança. E isto explica a orientação mandamental do não uso do nome de Deus em vão, o que virou uma praxe inclusive institucionalizada por certas seitas de caráter mercantilista. Na verdade, Deus independe do nome que se lhe dê, pois como disse Ghandi: “Deus é puríssima essência. Para os que têm fé nele, Deus simplesmente é.” Essa essência, que Ele personificou em Jesus Cristo, está baseada em uma conduta que envolve amor, misericórdia e justiça. Os fariseus antigos e modernos (só pensam na literalidade das escrituras) se afastam de Deus pois lhes falta um comportamento baseado nestes três pilares. São Tomás de Aquino ensina: “Toma cuidado com o homem de um só livro.”. Aquele é o comportamento que caracteriza a fé. Lembremos que Jesus Cristo viu a fé verdadeira em um centurião romano que, pedindo auxílio (cura) para um de seus servos, diz “Senhor, eu não sou digno de que entreis em minha casa. Dizei uma só palavra e meu servo será curado.” (Mateus 8, 5-13). Essa é a frase mestra prévia ao recebimento da eucaristia na missa católica. A maior fé não estava entre os Seus irmãos judeus ou mesmo em Seus discípulos. No mesmo episódio Jesus diz: “Em verdade vos digo: não encontrei semelhante fé em ninguém de Israel. Por isso, eu vos declaro que multidões virão do Oriente e do Ocidente e se assentarão no Reino dos céus com Abraão, Isaac e Jacó, enquanto os filhos do Reino serão lançados nas trevas exteriores, onde haverá choro e ranger de dentes.” Mesmo Pedro, nega Cristo por três vezes! E existe o episódio da barca em que Jesus fala nos homens de pouca fé (Mateus 8,26). Jesus reconheceu no centurião a fé, pois sua conduta continha amor, misericórdia e justiça. Essa conduta muitas vezes está mais presente dentre aqueles que negam a própria existência de Deus do que entre os auto-intitulados pios. Ele não é preconceituoso ou elitista, como comprova a passagem da conversa de Jesus com a mulher samaritana (João 4, 5-43). Portanto, pouco importa o nome que se dê a Deus, e a crença nele não está em gritos, preces, promessas, velas, ex-votos, … Deus está onde existe um comportamento centrado no amor, na misericórdia e na justiça. Menos desse comportamento, mais longe de Deus! Não importa, então, o nome de Deus. Ele estará em você, crendo você ou não, sempre que sua conduta for aquela. Usar o nome, qualquer que seja, de Deus em vão é o pecado daquele que atenta contra os três pilares na forma de conduta, ainda que diga nEle acreditar, que carregue a Bíblia a todo lugar, que se martirize, … “Não queira ser tido como santo antes que o seja, mas primeiramente seja para que como tal o tenham com mais fundamento.” (São Bento) Acreditar e estar em Deus significa servir ao próximo e quem serve será servido. “Com o coração se pede. Com o coração se procura. Com o coração se bate e é com o coração que a porta se abre.” (Santo Agostinho)
Autoria: Fernando Sá
Autores citados: São Luiz Gonzaga, Isaías, Ghandi, São Tomás de Aquino, São Mateus, São João, São Bento, Santo Agostinho